Capucha vermelha segue a mesma
linha de pensamento apresentadas em “casa dos ventos” com estreia em 2011 e
“adormecida” com estreia em 2012 no âmbito da capital europeia da cultura em
Guimarães.
Se nas criações anteriores se
pondera sobre as vivências em extinção, padrões de trabalho sociais colectivos
que desapareceram ou entraram em total declínio, e se reflecte sobre o olhar
urbano perante essas perdas sociais, reflexo de uma vivência rural de
tecnologia artesanal que perdeu o seu lado utilitário, ainda domínio e presente
no conhecimento directo de muitos homens e mulheres que habitam os mesmos espaços rurais, em capucha a
moralização é distante e afastada, é antes o olhar inverso.
Em capucha vermelha existiram
premissas que deram origem às opções dramatúrgicas do espectáculo. Premissas
que invertem o processo de aproximação anterior. Aqui não vamos criar o ponto
de equilibro entre o rural e o urbano, o tradicional e o contemporâneo, vamos
antes constatar os desequilíbrios e torna-los excessivos, marcar a sua
presença.
Capucha vermelha vai buscar ao
conto tradicional fixado por Perrault e depois adaptado pelos irmãos Grimm a
essência de uma viagem de amadurecimento, de confronto com os medos.
Sendo que o espectáculo pretende
caminhar num universo de símbolos, ponderámos que seria importante por parte do
espectador estar à partida ciente da narrativa primordial, ainda que afectada
pelas sucessivas e excessivas moralizações.
Assim uma mãe envia a sua filha
em direcção à avô, que durante o percurso trava conhecimento com o lobo que
ataca a avó para depois tentar atacar a filha, sendo que ambas serão salvas
pelo caçador.
Não será desta forma que será
feita a aproximação, mas antes rechear de carga simbólica cada um dos
elementos.
A mãe, urbana, reflexo da mulher
mãe, da mulher social, da mulher trabalhadora, da amante, da cuidadora, da
trabalhadora, num corrupio de tarefas e funções.
A criação “adormecida” levou
através dos apoios à internacionalização a companhia até Macau, e ali
marcadamente duas faces se apresentam, a indubitável presença portuguesa e
marcadamente a falta de espaço quer de habitação quer espaços arborizados… é
neste segundo elemento que nos inspiramos para definir a cidade..
A capucha,é a criança que ao
longo do espectáculo se torna mulher. Capucha é uma viajante, viaja no espaço
da cidade, viaja entre a cidade e o campo, viaja no campo, viaja em
pensamentos, desejos, esperanças e espectativas, viaja pelo mundo. O que
desencadeia esta viagem será o conceito de libertação. Um ponto de comparação
com a situação de muitos jovens em portugal, partir á descoberta, partir para
mais conhecimento, partir para uma vida melhor, na verdade a intenção é a da
partida, mas ao de leve falamos das muitas partidas que nos rodeiam.
No percurso existem 2
personagens, a lagarta e António lobo.
A lagarta desenraizada de um
outro conto “ alice” de Louis Carrol é uma figura enigmática que fala a capucha
de um mundo idílico, maravilhoso, fala-lhe de utopia, fala-lhe em esperanto,
enquanto o ar se torna inebriante, do odor do seu cachimbo. A lagarta
representa o mundo do sonho, do embelezamento da realidade, de uma certa
inocência intencional, talvez inconsciência numa apatia que a leva a nunca
mudar. Na lagarta habita uma realidade inventada. Ao longo do espectáculo a
lagarta caminha entre dois estados o de puro deleite e o de negação e
alienação.
António lobo é o próprio lobo,
enganador, perverso, arrogante, desequilibrado…este personagem reflecte em
exagero os nossos medos, sobre ele recaem males que queremos expurgar. António
é um jovem, que vê em capucha uma oportunidade…ao longo do espectáculo pouco ou
nada muda nele, ele é uma personagem linear.
A avó é uma mulher que habita o
espaço rural, criamos uma mulher mais velha dinâmica, moderna, tecnológica,
capaz de se auto defender, que habita o espaço rural por paixão e opção.
É nesta figura da avó que nos
deixamos levar pela ideia do espaço rural reinventado. Uma mulher que depois de
ter apreendido o mundo escolheu, pôde escolher. Que se deixou contagiar pelo
universo tecnológico recriando ideias, espaços virtuais, reinterpretando o
universo rural à sua medida. Uma quase obsessiva noção de controlo pessoal e
controle de segurança.
O lobo enfrenta a avó e consegue
que esta desapareça tentando iludir capucha, mas a avó vem acompanhada. Guardas
e repórteres levam a melhor sobre lobo, que feito prisioneiro, é capa de jornal
por instantes!
Capucha parte à procura do seu
próprio equilíbrio…ela não fica mas continua a sua viagem!
O espectáculo tem por objectivo
ser intenso, plasticamente, pontuado pela simbologia da cor.
O recurso as marionetas será
feito através das figuras de capucha, a lagarta, o lobo.
A mãe e avó serão a mesma actriz
através de adereços e na qualidade de movimento.
Os guardas e os repórteres serão
figuras virtuais presentes em projecções vídeo elaboradas através de cinema de
animação.